Há
muito tempo que venho pensando nisso. Se for parar para pensar, de fato, esta
matéria está bastante atrasada... Enfim.
Muitos
rpgistas têm dificuldade em compreender por que o uso das manobras de um
guerreiro, ladino, patrulheiro ou senhor da guerra estaria limitado ao formato
"por encontro" e "diário", na 4a edição de D&D (e,
agora, encaram habilidades de classe que recuperam após ‘descanso curto’ e ‘descanso
prolongado’ na 5ª edição, com a maior naturalidade, Hehehe). Outros se
questionam como é possível "curar" pontos de vida através de certas
proezas (aqui, na verdade, o que ocorre é uma confusão sobre o que significam
os pontos de vida na narrativa de jogo, o que já é tema polêmico desde a origem
da marca D&D, não foi problema só da 4a). E há os que se perguntam se é
correto imaginar um universo de fantasia onde magos e guerreiros têm poder
"equivalente e equilibrado" ao longo da progressão de níveis.
Não
sei se serei capaz de justificar tudo isso com o texto abaixo, mas acho que
consigo elaborar um pouco o tema, para estimular a imaginação. De certo modo, o
texto a seguir é o que eu imaginaria como introdução para o primeiro livro
'Poder Marcial', mas infelizmente esse 'fluff'
foi deixado quase omisso nesse suplemento, para ser mais bem trabalhado apenas
no segundo volume, que nunca foi (nem será) traduzido.
Espero
que a leitura seja interessante.
Nota: agradeço ao amigo Alvaro Júnior, do grupo do Facebook
D&D Next, pelos inspiradores argumentos sobre o tema nos diversos tópicos
onde o tema emergiu, e peço licença para argumentar a partir das suas ideias,
que me ajudaram a chegar às conclusões que busquei por longos anos.
Poder Marcial - O que é?
O poder marcial
representa a capacidade de alguns raros indivíduos de alcançar níveis elevados
de competência física e mental através de treinamento árduo, prática repetitiva
e disciplina rigorosa. Acima de tudo, o poder marcial não é algo leviano: um
soldado qualquer de uma milícia citadina pode dominar as manobras básicas da
espada ou da lança, ou proteger-se atrás de um escudo, mas apenas um verdadeiro
guerreiro, com talento natural e alto treinamento, consegue ser rápido e
intenso o bastante em seus golpes para derrubar vários inimigos em poucos
segundos, e deixar tremendo os que sobreviverem, se ainda permanecerem
acordados.
Mais do que
ações físicas, muitas proezas marciais envolvem considerável nível de atitude.
Autoconfiança, autocontrole, capacidade de intimidar oponentes e, em casos
extremos, a superação dos limites do físico através da bravura e da força de
vontade. Há quem diga também que a sorte favorece os bravos; se isso verdade, o
poder marcial legítimo é, em grande parte, a sorte levada a outro nível.
Algumas vezes,
um Poder Marcial representa o talento do indivíduo para perceber oportunidades,
como as fraquezas de um inimigo ou uma abertura na linha de defesa de toda uma
tropa. Certas manobras difíceis só se tornam viáveis em momentos especiais,
então olho atento e raciocínio rápido se incluem entre as peças fundamentais do
uso dessas proezas. Assim entendidos, muitos Poderes por Encontro ou Diários
não se tratam de uma escolha - são incisivo oportunismo.
Finalmente, não
se pode esquecer o valor significativo que o moral de uma tropa, o estado de
espírito de cada indivíduo e a força do espírito de equipe têm sobre o sucesso
de uma empreitada. É fundamentado nesse valor que a Cura Marcial pode ser
compreendida. Um Senhor da Guerra pode
incitar seus companheiros a descobrirem em si mesmos capacidades que, em outras
situações, nem eles próprios acreditariam ter. Ele pede que ignorem a dor,
acreditem em seu potencial, recordem momentos importantes de seus treinamentos
e permaneçam focados no sucesso, não nos obstáculos. Disso retiram forças, e
quanto mais eloquente forem os discursos e brados de batalha, maiores os
resultados, o que se percebe pelos níveis dos Poderes.
O golpe decidido
da lança que perfura até as escamas de um dragão; o manejo ágil da rapieira,
que impressiona os aliados e amedronta o adversário; a flecha sorrateira,
intuitivamente disparada contra o ponto fraco de uma aberração alienígena; e o
brado alucinado do líder na linha de frente, que incita a fúria e a coragem até
no espírito mais aflito. Esse é o Poder Marcial!
Escala de poder dos heróis marciais
Embora seja
fácil imaginar um mago poderoso convocando raios interdimensionais, com olhos
faiscantes e fazendo ressoar trovões à volta de seus dedos, raros jogadores
conseguem imaginar poder equiparado numa versão marcial. E, de fato, poucos
compreendem que essa equivalência transparece nas regras, por razões de
mecânica e jogabilidade, mas que o próprio contexto imaginativo-narrativo da 4a
edição foi elaborado para levar isso em conta. Está no seu estilo, no seu
clima, na sua forma diferenciada, e por essa alteração de paradigma (entre
outras razões) que ela se torna única. Esse é o grande equívoco que leva tantos
questionadores a vociferarem "a magia sempre tem de ser mais
poderosa".
Compreender a
atuação dos heróis marciais exige, portanto, uma definição de escala.
No estágio
heróico, o aventureiro marcial já é um indivíduo acima da média. Atlético,
ágil, atento, ousado, corajoso - cada uma dessas qualidades pode estar num grau
considerado impressionante. A competência para algumas tarefas pode estar ainda
limitada por ocasionais inseguranças ou pela curta vivência, porque ele ainda é
um indivíduo "normal", mas no final do estágio, até algumas leis
limitantes da física começam a se tornar barreiras mais tênues, ocasionalmente
superáveis.
No estágio exemplar,
o aventureiro marcial encontrou, pela persistência no treinamento e pela
crescente autoconfiança, maneiras de se tornar algo além do que o conhecimento
comum pode explicar em poucas palavras. De certa forma, ela extrapola todas as
medidas previsíveis para indivíduos normais, seja no alcance de seus sentidos,
na potência dos seus golpes ou na velocidade de seus pensamentos. Se o
guerreiro do estágio heróico é como um beagle treinado, o mesmo guerreiro será,
no estágio exemplar, um urso atroz armado até as
presas.
O aventureiro
marcial em estágio épico não é nada menos do que uma lenda viva, um semideus em
potencial e a realidade se dobra diante de seu esforço. Quando ele golpeia, a
potência ou precisão descomunal desse golpe não vem apenas de seu movimento,
mas da inabalável força de sua determinação e nenhum limite físico se aplica à
sua capacidade. Neste estágio, o Poder Marcial também está imiscuído pela magia
inerente ao mundo fantástico onde ele se aventura, embora ele próprio possa não
estar ciente disso. Ele não é dotado de poder - ele É este poder, em forma de um ser vivo.
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