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sexta-feira, 16 de setembro de 2022

Coop RPG - Tutorial para jogar Campanhas de RPG em grupo sem Mestre

 Já faz algum tempo que eu não alimento este blog... A irregularidade é uma das coisas mais certas da minha rotina... Enfim, vamos ao assunto do dia!

Muitos meses atrás, eu publiquei um vídeo em meu canal do Youtube, o Covil do Narrador, sobre este incrível modo de jogar RPG, onde você não fica dependente de encontrar Mestre para um grupo em que ninguém quer ou sabe mestrar e onde também quem está acostumado a sempre mestrar pode se livrar divertidamente desse fardo. O tempo passou e eu já experimentei a modalidade mais vezes, li e estudei mais acerca do assunto e agora posso falar algo bem mais detalhado sobre o assunto.

Infelizmente, ando sem tempo regular - como ocorre com tudo - para gravar meus vídeos, então recorro mais uma vez ao Blog para complementar o tema. E já faço aqui um alerta importante: jogar RPG sem Mestre é incrível, mentalmente enriquecedor e, de várias formas, pode te ajudar a ser um jogador "melhor" (no sentido de vivência com o jogo, de pegar as manhas) ou mesmo te ensinar a ser Mestre (ou melhorar sua capacidade como Mestre), como, aliás, o modo Solo também pode fazer por você; mas, que fique bem claro, é um modo diferente de ver e jogar RPG. Nem pior, nem melhor, apenas diferente. (Ocorreu-me agora que o Modo Coop é uma espécie de Modo Solo para grupo, ou que o Modo Solo é um Coop com apenas um cara... se não entendeu, não se preocupe, a sua ficha vai cair daqui a pouco).

Vamos ver na postagem de hoje uma espécie de passo-a-passo genérico para jogar Coop RPG. Espero que seja proveitoso, principalmente para quem ainda não experimentou a modalidade e está buscando aprender, mas acho que também pode ser uma leitura bacana para os já experimentados. Bora lá?




Passo 0 - Grupo

Nem precisaria dizer que, para jogar RPG em grupo sem Mestre, você ainda precisa de grupo... Mas, como um bom fã de manuais técnicos, achei que seria interessante incluir essa parte XD.

Presencial, ou por meio de fóruns, por videochamadas... Tanto faz. A dinâmica poderá ser razoavelmente diferente em vários momentos, mas funciona de todo jeito.

Passo 1 - Sessão Zero

Eu falei da importância da sessão zero para Campanhas tradicionais, com o Mestre e seu grupo, em um vídeo do canal, mas isso também é importante, até mais que para o modo tradicional de jogar, numa campanha Coop. Por exemplo, quando se pretende jogar pela internet com alguém que você não está suficientemente familiarizado, pode ser interessante você passar algum tempo apenas batendo um papo e a sessão zero servirá pra isso. Adicionalmente, vocês definirão juntos: que sistema será usado, o cenário (se ele não for atrelado ao sistema), o tipo de história que querem contar (e/ou o que não querem), que personagem cada um fará, que vínculos existirão entre eles, quais são seus objetivos de curto e longo prazo, motivações e, nunca é demais repetir, as regras da mesa - tanto no que se refere às alterações desejadas e planejadas para o sistema de escolha, como a respeito do comportamento esperado (ou que não seria desejado) de cada um. NÃO ESPERE AS COISAS SE TRANSFORMAREM EM TRETAS, previna-se!

Uma coisa importante sobre a escolha do sistema: a maioria dos sistemas de RPG por aí (ou talvez não seja mesmo a maioria, já que há um monte de jogos indie pelo mundo que acabam desconhecidos do grande público) não possui em seus módulos básicos regras próprias para jogar sem Mestre. Não se preocupe: existem dezenas, talvez centenas de oráculossistemas oraculares ou emuladores de mestre na internet e você pode usá-los como anexos ou suplementos para o seu sistema favorito.

Dependendo da proposta do sistema/cenário, a sessão zero pode ser útil para construir o mundo de jogo em detalhes. Esta checklist pode te ajudar: 

  1. instituições, organizações ou facções importantes
  2. fatos relevantes do passado remoto ou recente
  3. características culturais e sociais predominantes do local onde tudo começa
  4. personagens do cenário que podem se tornar alvo dos "holofotes"
  5. peculiaridades que diferenciam a sua mesa de outras neste cenário

Mas, por favor, atente a esta informação: é esperado e até desejado que elementos da campanha sejam criados de modo emergente, ao longo das sessões de jogo, até diria "do nada", então não se apegue demais aos detalhes. Até porque nem você, nem ninguém mais no grupo, está querendo sem Mestre aqui. Também não esqueça que você tem as tabelas do emulador de Mestre à sua disposição, então, se você não consegue pensar em nada, pergunte às tabelas!

Por fim, a sessão zero pode ser usada para dar início à trama: o grupo rolará nas tabelas do emulador de Mestre e interpretará os resultados, conforme o cenário já estabelecido e seus próprios desejos para a campanha. Aqui, refaço a recomendação fundamental que dei no vídeo sobre Coop RPG: dividam essa tarefa e compartilhem a diversão, pra que ninguém sinta o peso do fardo do Mestre, nem acabe sendo um estrelinha, "o dono da bola", que fica mandando no que está acontecendo. Cada jogador no grupo rola numa das tabelas necessárias e interpreta o resultado conforme lhe aprouver e o jogador seguinte sempre considera o que já foi dito pelos demais ao interpretar o resultado da sua própria jogada. Não é impossível que aconteçam divergências, lógico, mas é provável que vocês consigam rapidamente chegar a um consenso com poucas discussões, afinal, foi para evitar problemas que vocês tiveram as conversas iniciais.

Passo 2 - Finalmente, a jogatina!

Chegou o dia e hora marcados para começar a jogar. E agora? Uma vez que não temos um Mestre, quem dará o primeiro (ou próximo) passo?

É muito provável que vocês já tenham discutido sobre essa dinâmica na sessão zero, mas, se não o fizeram, aqui vão algumas sugestões de quem deve começar o jogo, numa espécie de ordem de prioridades:

  1. aquele que mais jogou RPG Coop até agora;
  2. aquele que estiver mais familiarizado com emuladores de Mestre;
  3. aquele mais estiver familiarizado com o sistema/cenário escolhido;
  4. quem levantar o dedo primeiro;
  5. o mais velho;
  6. o dono da casa;

Decidido quem começa, estabeleçam entre si uma regra para que a dinâmica siga adiante - sentido anti-horário na mesa, o próximo na lista de prioridades, quem levantar o dedo primeiro, etc.

E agora que você sabe de quem é a vez, o que se deve fazer?

Grave estas três etapas: definir, decidir e dialogar.

Na etapa de definir, você diz o que seu personagem está ou esteve fazendo até o momento em que a história ou a cena tem início. Onde está, com quem interagiu, coisas que ele sabe. Na etapa seguinte, decidir, você fala sobre coisas que ele quer fazer, alguma ação ou atitude que vai tomar que possa ter consequências ou relevância para a história ou para a sequência de eventos que estão se formando. Por fim, ao dialogar, você faz perguntas aos demais jogadores, debate sobre suas respostas e escolhe, ou aceita, o que eles tiverem dito, para que novas três etapas possam vir a ser usadas a seguir, por algum deles, ou por você mesmo. Detalhe: as três etapas podem ser usadas em qualquer ordem, variando em cada uma das vezes em que você tomar a palavra ou mesmo se misturarem.

Em todas as três etapas, o sistema principal pode vir a ser usado, assim como as tabelas de emulação de mestre. Em geral, é esperado que você, que tem a vez agora, saiba o que usar do sistema, que teste aplicar ou mesmo se um teste precisa ser feito. Se não souber, ou estiver em dúvida, pergunte aos demais participantes. Pela mesma lógica, o emulador de Mestre pode vir a ser consultado em qualquer uma das três etapas.

Mas quando o emulador de Mestre deve ou precisa ser consultado? Essa é a dúvida mais comum de quem está começando. A resposta curta é: quando você quiserem. Sendo mais detalhista:

  1. quando vocês não tiverem nenhuma ideia do que vai acontecer
  2. quando vocês estiverem com uma dúvida sobre o que é justo
  3. quando cada um tiver uma ideia diferente do que acontecerá a seguir, ou quando um mesmo jogador tem mais de uma ideia

Alguns livros recomendam que, ao ser necessário consultar os oráculos, o jogador da vez faça a pergunta, mas a resposta seja dada por outro. Noutras fontes, o jogador que quer fazer a consulta também fica responsável por estabelecer qual tabela será consultada e a interpretação de seu resultado. Estabeleçam de comum acordo entre o grupo qual será a sua dinâmica, ou sigam à risca o módulo emulador de Mestre escolhido.




Passo 3 - Indo adiante

Assim que um pedaço da história ou cena de um personagem se resolve, é óbvio, o jogador passa a vez ao seguinte. O bom senso e o comum acordo devem facilmente estabelecer quando isso ocorre. Também podem ocorrer, como em partidas do modo tradicional, momentos em que não existe uma "vez" de cada um e todos estão interagindo e atuando de modo mais orgânico e natural.

Mas e quanto aos NPCs? Como ficam os diálogos com eles? A resposta é esta: nenhum de vocês e todos ao mesmo tempo. No caso específico de um diálogo, escolha um outro jogador para lhe dar as respostas; mas, quando se tratar da possibilidade de aquele NPC agir de forma hostil, opositora ou que prejudique um dos PJs, estabeleçam de comum acordo quem consultará os oráculos e, por razão de não haver arbitrariedade, nem intrigas, nem revanchismo, deixem que os dados (e, por conseguinte, a sorte ou azar do jogador), digam o que acontece.


Considerações finais

O texto pode ter ficado enorme, mas você verá que não é difícil jogar RPG Coop. Até mesmo quem nunca jogou RPG pode aprender facilmente, no mesmo ritmo que aprenderia RPG tradicional, embora outros jogadores da mesa, mais experientes, possam ter que ficar dando sugestões e apontando opções de jogo a todo momento. Nada impede, porém, que um jogador recém chegado ao próprio RPG aborde o Coop como sua primeira experiência depois de ter adquirido um módulo de regras que inclua essa modalidade -  como os livros da série Solo10 (de Jefferson Pimental e Bruno Sathler), o Altaris (do Tiago Junges), ou o Intrépidos (do Cezar Capacle). Se, por outro lado, o que você busca é um modo de jogar Coop com o seu sistema de RPG favorito, a trilogia MEME, do Tiago Junges pode ser um bom começo (esse documento inclui um sistema minimalista independente que, no caso de já ter outro sistema em vista, você não precisará).

Em tempo, VALE DIZER: você pode seguir diversas das dicas dadas aqui também para jogar One-shots, ou seja, partidas curtas e únicas, fechadas em seu enredo, sem expectativa de continuidade. E muitas dessas dicas também servem se você estiver querendo começar a jogar RPG Solo e não sabe por onde começar.

E é isso! Boas jogatinas! Se precisarem de transcrição de exemplos, deixem o pedido nos comentários.